terça-feira, 29 de novembro de 2016

Natal sem luz – um brilho na escuridão





             Essa seria mais uma história de uma pequena vila situada no sopé de uma montanha coberta de gelo se não fosse por um único motivo: algumas pessoas odiavam o natal.

            A história começou há exatos vinte e cinco anos, quando muitas das crianças da vila nem sequer eram nascidas. Era véspera de natal e toda a cidade se reunia para comemorar a data mais esperada do ano, quando era feita ao ar livre uma grande festa, com danças e comidas típicas, muita música, brincadeiras em torno de pinheiros decorados, luzes cintilantes de várias cores que acendiam e apagavam, alegrando os cidadãos daquela pacata, mas feliz cidade.

            Quando todos se abraçavam comemorando a chegada do dia vinte e cinco, uma grande avalanche de neve desceu da montanha, arrasando grande parte da cidade, tendo como saldo a morte de vinte pessoas de famílias diferentes.

               A cidade foi reconstruída, mas aquelas vinte famílias nunca mais foram as mesmas. Na véspera de natal, apagavam suas luzes, fechavam suas portas e não participavam dos eventos natalinos. Passaram a ser conhecidas como PWL - “people without light” – pessoas sem luz.

                A cidade queria esquecer o evento fatídico e todo ano fazia suas festas reverenciando seus mortos, mas não deixando de comemorar o natal da forma que tradicionalmente fazia: muita luz, muita alegria e muita confraternização.

                 As pessoas afetadas pela tragédia achava uma afronta dos moradores da cidade comemorarem uma data que trazia tanta tristeza para eles. Por unanimidade, resolveram construir suas casas afastadas da cidade, ao pé da montanha nevada que lhes causou tanta dor. Passaram a adotar meio de vida totalmente diferente da cidade. Se as luzes brilhavam no natal, eles apagavam suas luzes; se havia decoração com verdes pinheiros, eles decoravam suas casas com galhos secos; se havia música alegrando as crianças da cidade, na comunidade PWL havia silencio e a alegria era substituída pela dor da perda e pela revolta.

                As crianças foram educadas a entender o natal de outra forma. Para elas o natal era dia de lembrar-se da morte de seus entes queridos e reverenciá-los, abstendo-se de qualquer prazer, de qualquer sorriso, de qualquer ato que refletisse felicidade e contentamento.

                Na casa de Joseph e Mary havia duas crianças e a família se preparava para a chegada de mais um bebê.  A casa era simples como todas as outras dezenove da vila, mas esta era especial, pois ficava na parte mais próxima da montanha, num lugar alto e com uma excelente propagação do som, de modo que a brincadeira preferida das crianças era ouvir a própria voz ecoada.

                As crianças estavam contentes, Joseph contando os dias e Mary fazia alegremente as roupas do menininho. A família transbordava de alegrias e decorava a casa para a chegada do bebê, cujo nascimento seria anunciado através do sino. Todas as vezes que o sino tocava numa casa, era sinal de que a vila ganhara mais um bebê e todos os moradores tocavam seus sinos, desejando felicidades ao recém-nascido e a toda família.

                No dia 24 de dezembro de 2022, quando todos se preparavam para a noite nefasta de natal, apagando suas luzes e seguindo o ritual macabro de celebração da morte, ouviu-se o choro de uma criança ao fundo, choro esse que aumentou e de repente o sino começou a tocar na casa de Joseph, anunciando que Mary havia dado luz ao tão esperado bebê.

                Naquela casa especial havia luz, alegria. As crianças prepararam com suas próprias mãos presente para o irmãozinho que acabara de nascer. Mary não fez somente roupas para o bebê, mas também para os dois filhos e Joseph havia separado a melhor caça para o dia em que a criança nascesse.
          
               Todas as demais casas acenderam suas luzes, tocaram seus sinos e cada família pode contemplar a vida na face de seus parentes. Ao olharem para a montanha, o povo viu uma grande luz que saia da casa de Joseph e se projetava pela montanha, iluminando toda a cidade.  A felicidade da casa de Joseph e Mary contagiou toda a vila, mas ninguém ousou sair de suas casas e quebrar a tradição. Mas todos reservaram presentes para o dia seguinte.
                Joseph, por sua vez, contou aos seus filhos que a palavra natal significa nascimento. Assim como eles ficaram felizes pelo nascimento do bebê, não fazia sentido permanecerem vivendo o luto como se a vida não continuasse e se o aniversariante fosse o culpado pelas tragédias da vida.

          Mary propôs que a partir daquela data a família comemorasse o nascimento do rebento com muita alegria, porque um menino lhes nasceu, um filho lhes foi dado no dia do nascimento de Jesus que é maravilhoso, conselheiro, Deus Poderoso, Pai Eterno, Príncipe da Paz.

               Em comemoração ao dia em que o menino nasceu, ele foi chamado de Yeoa, filho de Joseph e Mary, irmãos de Simon e Thiago.  A felicidade voltou a reinar naquela família e o propósito dela era não mais carregar o título de “pessoas sem luz” e ter o coração cheio de amarguras e trevas.  Queria regressar ao primeiro amor quando o natal era a comemoração pelo nascimento de Jesus, o Cristo que veio trazer luz e salvação para o povo que andava em imensas trevas.

                E assim foi. Eles deixaram de comemorar o natal de Jesus e passaram a reverenciar o Jesus do natal. A felicidade voltou à vila que se juntava nas épocas comemorativas aos demais moradores da cidade e viviam uma nova história de natal com muita paz, como muita esperança de dias melhores, mais cheios de graça, mais cheios de vida, mais cheios de luz.